giovedì 2 ottobre 2008

Cardoso Pires no DN

O escritor português José Cardoso Pires, tema de um convénio a 17 de Dezembro de 2004 na Faculdade de Letras da Università degli Studi di Roma Tre - “José Cardoso Pires. La scrittura e l’impegno” - foi recordado na edição de hoje do Diário de Nottícias, num artigo de Isabel Lucas.

Cardoso Pires foi traduzido em Ialiano logo nos anos 60 (L' ospite di Giobbe, Milano : Lerici, 1963) e em 79 sai em Roma o seu Il delfino com introdução de Antonio Tabucchi. Rita Desti traduz Ballata della spiaggia dei cani, publicada em Milão pela Feltrinelli (1985) e doze anos depois surge Lisbona : libro di bordo : voci, sguardi, memorie na tradução de Cecilia Pero, pela mesma editora. Seguem-se L' angelo ancorato (trad. Mauro Raggini, Roma : Fahrenheit 451, 1999), De profundis : valzer lento (trad. Roberto Francavilla, Milano : Feltrinelli, 2002), Gli scarafaggi (coord. Federico Bertolazzi ; com um texto de Aniello Angelo Avella: "La lingua portoghese, patria di molte patrie. Le culture di espressione portoghese nel mondo contemporaneo"; Roma : Le nubi, 2005) e, no ano passado, Dinosauro eccellentissimo (trad. Delia Occelli ; Roma : Vertigo, 2007).


Eis o texto de ISABEL LUCAS:

Outubro, sempre Outubro. Nasceu em Outubro, faz hoje 83 anos. Morreu em Outubro está quase a fazer dez anos. Em Dezembro de 1997, pouco depois de ser o primeiro romancista a vencer o Prémio Pessoa, anunciava-me numa entrevista um novo romance para o Outubro seguinte. Foi nesse Outubro seguinte, o Outubro de 1998, que morria, após quatro meses de coma, às duas e meia da madrugada do dia 26, sem que nenhum romance novo tivesse saído.

A conversa foi em Dezembro. Demorada no tom rouco da voz. Dezembro, numa tarde fria com a pouca luz do Inverno a entrar pela janela que dava para a igreja de Alvalade. Vestia uma camisola amarela, de um amarelo desmaiado que contrastava com o amarelo dourado do copo de whisky misturado com agua que ia levando à boca. Acabara de editar Lisboa, Livro de Bordo, dedicado à cidade onde só não nasceu por acaso, porque como dizia, a sua mãe tinha qualquer coisa de salmão "e ia desovar a norte". E só por isso foi nascer a Peso, na Beira, a 2 de Outubro de 1925. Cardoso Pires conversava e falava dos seus ódios e amores. De como detestava o Natal e o campo, do politicamente incorrecto confessar que não achava Torga assim um tão grande escritor; de como embirrava com o adjectivo; da sua paixão por Lisboa e por uma boa briga; por longas conversas em bares; por se isolar na casa da Costa da Caparica, virada para o mar, onde ia desenhando na parede as movimentações das personagens, numa espécie de mapa narrativo em que se perdia como quem perde a identidade para dar identidades às personagens. Cardoso Pires conversava, mas temia o modo como essa palavra falada podia aparecer escrita. É que para ele, a palavra escrita tinha outro ritmo. Tinha de ser escolhida. Não era ao acaso. Dizia e emendava, como quem escreve outra versão de um romance. Dizia e rescrevia o dito com um letra miudinha, pensada, limpando adjectivos, substantivando. E aquilo lido parecia rápido. Veloz como os seus romances. Engano.

Cardoso Pires era lento, muito lento na escrita e fazia ironia com os escritores rápidos. Em 50 anos, publicou 18 títulos. O Delfim, Alexandra Alpha, A Balada da Praia dos Cães ficarão como textos maiores da literatura. Saíram lentos, com tantas versões até sair a certa. Cada palavra tinha de ser certeira. Nem a mais, nem a menos. E nesse medir de palavras disse: "Estou convencido de que um dia parto uma unha do pé e morro." Nem mais uma palavra.


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